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18 de Abril de 2024
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    Jurista ressalta a necessidade de uma maior punição nos casos de abandono afetivo

    Dois casos ganharam destaque recentemente na Justiça, envolvendo questão de abandono afetivo. Um deles na 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP); o outro, na Vara Cível da Comarca de Brasileia, no Acre.

    A 2ª Câmara de Direito Privado do TJSP reformou uma decisão da Comarca de Limeira, julgando como procedente o pedido de indenização de uma mulher por abandono afetivo e material do seu pai. O valor definido para a reparação foi equivalente a 45 salários mínimos.

    De acordo com os autos, o pai da autora abandonou a família, faltando com a assistência moral, afetiva e material. Ele alegou, em sua defesa, que o afastamento se deu por desentendimentos com a mulher. Mas, quando a filha o procurou, 20 anos depois, a tratou bem.

    Para o relator, Luiz Beethoven Giffoni Ferreira, o réu faltou com o dever de prover assistência e alimentos para com a filha, e a pena pecuniária é devida pelo abandono consciente e voluntário promovido por ele. O voto foi acompanhado por unanimidade pelos outros desembargadores presentes.

    Abandono moral e efetivo de idoso

    Já decisão da Vara Cível da Comarca de Brasileia-AC responsabilizou uma herdeira por abandono moral e afetivo de idoso, destinando a ela R$ 4.937,36, o equivalente apenas a 50% do valor total da herança, enquanto os outros 50% foram fixados ao Lar dos Vicentinos, em Cáceres/MT, instituição onde o falecido pai passou os últimos anos de vida.

    “Ao demonstrar ingratidão, desapreço ou ausência de sentimento afetivo para com o de cujus, submetendo-o ao desamparo e a solidão, nada mais justo que deferir o pleito em somente 50% do valor existente em conta bancária em favor da autora, proporção esta que a lei lhe garante no direito sucessório”, relatou o juiz Gustavo Sirena.

    Ao analisar o mérito, verificou-se na certidão de óbito que o lugar do falecimento foi o Lar dos Vicentinos, e que, na ocasião da lavratura do documento, o funcionário do local não soube informar se o idoso deixava filho, o que demonstra a ausência de contato entre as partes. Em suas alegações, a autora ressaltou que o reconhecimento da paternidade ocorreu há apenas oito anos, quando pôde conhecer o pai.

    O advogado Rolf Madaleno, diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, é favorável à indenização pelo efetivo abandono afetivo, “que se caracteriza pelo deliberado e propositado afastamento de um pai que ignora a existência de um filho. Seja não registrando-o; ou registrando-o e o abandonando. Não precisa ser um abandono material, mas um abandono afetivo, com relação aos cuidados, se afastando da existência desse filho, não procurando, não se inteirando, evitando a convivência. Mesmo que pague a pensão alimentícia, para mim existe um real e efetivo abandono, e esse abandono precisa sim ser combatido através da responsabilidade civil, da indenização pelo descuido, pelo não dever de cuidar do filho”, afirma.

    Sobre as leis que visam combater o abandono afetivo, ele comenta: “Infelizmente, neste País, as leis chegam com muito atraso, e a renovação da própria jurisprudência às vezes demanda algum tempo, quando a gente verifica que em outros países já estão decidindo neste ou naquele sentido já de longo tempo. Isso acontece aqui com relação ao abandono afetivo. Veja, por exemplo, um pai que abandonou um filho e nunca se interessou, pode tê-lo registrado ou pode até não ter registrado, mas se afasta, não tem uma convivência sequer. A pergunta que eu faço é a seguinte: se este filho morre e não há outros filhos ou descendentes, o pai que o abandonou teria direito à herança? Se tivesse registrado, teria direito à herança, porque a nossa lei não prevê perda do direito hereditário pelo abandono afetivo. Ao contrário de outros países, que ampliaram o leque em casos de indignidade e incluem o abandono afetivo como causa de indignidade, como um motivo para excluir da herança um pai ou um filho, porque é uma via de duas mãos.”

    O jurista prossegue: “Filhos que abandonam os pais, pouco importa se eles são registrados, mas que ignoram e excluem a existência dos pais da vida deles. Quando os pais falecem, só porque eles são considerados herdeiros necessários, vão lá e recolhem a herança de alguém que eles nunca se preocuparam, de alguém que eles não sustentaram, e assim por diante. De sorte que como se trata de uma via de duas mãos, para mim deveria não só ter lugar a indenização pelo abandono afetivo, e aí considero abandono afetivo dos pais em relação aos filhos, e no caminho inverso, dos filhos em relação aos pais, e dentre os efeitos deste abandono afetivo incluo a exclusão do direito de herdar por indignidade. Seja do pai que falece, seja do filho que falece. O pai ou o filho que abandona o seu progenitor ou seu descendente deveria sim ser excluído da herança daquele, sem prejuízo da ação de responsabilidade pelo abandono, porque afinal de contas os parentes devem ter, no mínimo entre si, um ato de solidariedade.”

    Na opinião de Rolf Madaleno, um dos motivos pelos quais existe uma situação tão evidente, clara e nefasta de abandono está exatamente no fato de que a nossa lei não prevê nenhum tipo de punição. “Não prevê a exclusão do direito hereditário por indignidade, por abandono, porque deveria ser um ato de exclusão do direito de herança, mas não existe essa punição, não existe esse efeito. Pelo contrário, na nossa legislação os ascendentes e descendentes são herdeiros necessários e aconteça o que acontecer eles sempre terão direito à herança, salvo aquelas causas expressas e antigas, previstas no Código Civil desde 1916, como motivos de indignidade, que são extremamente insuficientes. Códigos mais modernos já avançaram e já incluíram outras causas de indignidade, e entre essas outras causas estão aí exatamente o abandono afetivo, o abandono material, o abandono psicológico. É por isso que aqui a impunidade reina ainda solta, tranquila, porque existem muito mais garantias do que punições”, afirma.

    Projetos de Lei

    Atualmente, estão em tramitação:

    PLS 470/2013 - Estatuto das Famílias (elaborado pelo IBDFAM), que prevê em seu artigo 108: “Considera-se conduta ilícita o abandono afetivo, assim entendido a ação ou a omissão que ofenda direito fundamental da criança ou adolescente”;

    PLS 700/2007 (de autoria de Marcelo Crivela), que modifica a Lei 8.069/90 (ECA) para caracterizar o abandono moral como ilícito civil e penal;

    PL 4294/2008 (de autoria de Carlos Bezerra), que acrescenta parágrafo ao art. 1.632 da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil e ao art. da Lei nº 10.741, de 1ª de outubro de 2003 - Estatuto do Idoso, de modo a estabelecer a indenização por dano moral em razão do abandono afetivo.

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