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26 de Abril de 2024

Para STJ, com a EC 66/2010 não subsiste audiência de conciliação em Divórcio Direto Consensual

Para o ministro Moura Ribeiro,legislação infraconstitucional não deve prevalecer sobre a Constituição

O ministro Moura Ribeiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou provimento ao recurso especial interposto pelo Ministério Público do Rio Grande do Sul (MP-RS) que pretendia anular a homologação de um divórcio que foi realizada sem audiência de conciliação. O voto do ministro Ribeiro foi seguido à unanimidade pelos demais ministros da Terceira Turma do STJ.

O MP-RS apontou ofensa aos artigos 535, II, do CPC e 40, § 2º, da Lei nº 6.515/77 e 1.122, §§ 1º e 2º, do CPC. Alegou que houve vício de omissão no acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, acerca do disposto no artigo 40, § 2º, da Lei nº 6.575/77, que prevê que a audiência de conciliação é obrigatória no divórcio consensual.

O MP-RS alegou, ainda, que o novo texto constitucional, através da Emenda Constitucional nº 66, de 2010 (EC66/2010), não revogou as disposições infraconstitucionais a respeito do divórcio consensual, tendo apenas retirado a antiga exigência de comprovação do preenchimento do requisito temporal para obtê-lo.

Por fim, reiterou que a audiência de conciliação é obrigatória no divórcio consensual e que as partes não foram ouvidas perante o magistrado, não tendo sido, portanto, observado o procedimento legal.

De acordo com o ministro Moura Ribeiro, em seu voto, o acórdão recorrido não foi omisso, pois apontou expressamente os fundamentos da desnecessidade da audiência de ratificação. Para ele, faz toda a diferença, no caso, o fato de ser um Divórcio Direto Consensual, pretendido após a EC 66/2010. Tal emenda foi proposta pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).

Mudança significativa- O ministro explicou que a figura do divórcio surgiu no ordenamento jurídico brasileiro em 1977, com a promulgação da Lei nº 6.515/77 (Lei do Divórcio),constituindo avanço e solução adequada a inúmeros problemas de divergências conjugais.

Antes disso, a única solução oferecida por lei era o desquite, que mantinha os cônjuges presos ao vínculo contratual, mas colocava fim ao regime matrimonial de bens e aos deveres de coabitação e fidelidade recíprocas. Entretanto, não disponibilizava aos desquitados a contratação de novo casamento, levando as uniões à margem da lei, apenas em entidades religiosas que assim permitissem, ou em países estrangeiros, com casamentos sem validade perante o ordenamento legal brasileiro.

Contudo, segundo Ribeiro, apesar do avanço, as limitações contidas na Lei do Divórcio eram enormes, sendo possível a dissolução do vínculo conjugal apenas uma única vez. O Divórcio Direto somente era possível se atendesse a três requisitos: separação de fato há mais de cinco anos; ter este prazo sido implementado antes da alteração constitucional; ser comprovada a causa da separação. Esses requisitos foram alterados com o advento da CF/88, passando-se a admitir o Divórcio por Conversãoapós apenas um ano de separação judicial, e o Divórcio Direto após mais de dois anos da separação de fato.

Posteriormente, o Código Civil de 2002tratou das questões relacionadas com a dissolução da sociedade conjugal, tanto pela separação quanto pelo divórcio, mas sem grandes novidades. Segundo Moura Ribeiro, a“significativa mudança” veio com a Emenda Constitucional 66 de 2010, chamada popularmente de “PEC do Divórcio”, que deu nova redação ao artigo 226, parágrafo 6º, da Constituição Federal (CF), o qual passou a vigorar com o seguinte texto: O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.

“Como se vê, a nova redação afastou a necessidade de arguição de culpa, presente na separação, não mais adentrando nas causas do fim da união e expondo desnecessaria e vexatoriamente a intimidade do casal, persistindo tal questão apenas na esfera patrimonial quando da quantificação dos alimentos. Também eliminou os prazos à concessão do divórcio. Assim, qualquer dos cônjuges poderá buscar o divórcio sem declinar de seus motivos ou aguardar qualquer lapso ou carência. Cria-se nova figura totalmente dissociada do divórcio anterior. Trata-se de norma constitucional de eficácia plena que, exatamente por isso, torna desnecessária a edição de qualquer ato normativo de categoria infraconstitucional para que possa produzir efeitos imediatos”, disse o ministro.

Constituição deve prevalecer sobre legislação infraconstitucional- De acordo com Moura Ribeiro, os artigos 40, parágrafo 2º, da Lei nº 6.515/77 e 1.122, parágrafos 1º e 2º, do Código de Processo Civil (CPC), passam a ter redação conflitante com o novo entendimento, ao se exigir uma audiência a fim de se conceder o Divórcio Direto Consensual, quando não há mais condições pré-existentes: de averiguação dos motivos e do transcurso de tempo.

“A novel figura passa a ser voltada para o futuro; o que passou ficou no passado, prestigiando o que virá. Passa a ter vez no Direito de Família a figura da intervenção mínima do Estado, como deve ser. Lembrando tal teoria, Maria Berenice Dias, citando Pablo Stolze,esclarece que“em sua nova e moderna perspectiva, o Direito de Família, segundo o princípio da intervenção mínima, desapega-se de amarras anacrônicas do passado para cunhar um sistema aberto e inclusivo, facilitador do reconhecimento de outras formas de arranjo familiar. O princípio da intervenção mínima do Estado na vida privada e, melhor ainda, nas relações familiares, aliado ao da Deterioração Factual, servirão de base para a aplicação do Direito, em se tratando de dissolução do matrimônio”, reflete.

O ministro ressaltou que, com o advento da EC66, de 2010, que acabou com a discussão da culpa pelo fim do divórcio e demais requisitos impostos antigamente, o Divórcio Direto Consensual, portanto, não exige a audiência de ratificação e legislação infraconstitucional que diga o contrário, para ele, não existe mais.

“Caberá ao Estado uma mínima intervenção em caso de divórcio consensual, no qual não há lide. Vale relembrar que, na ação de Divórcio Direto Consensual, não há causa de pedir, inexiste necessidade de os autores declinarem o fundamento do pedido, cuidando-se de simples exercício de um direito potestativo. Portanto, em que pese a determinação constante no artigo 1.122 do CPC, entendo que não mais subsiste o referido artigo para casos iguais ao presente. Outrossim e principalmente em razão de não mais haver que se apurar causas da separação para fins de divórcio, não cabe a referida audiência, por se tornar letra morta”, assegurou.

O ministro destacou que o artigo 1.122 do CPC cuida da audiência em caso de separação e posterior divórcio, e que não havendo mais a separação e sim o Divórcio Direto Consensual, descabe sua aplicação. Para ele, a audiência de conciliação ou ratificação teria apenas cunho formal. Ele destacou ainda que normas infraconstitucionais, tais como o CC, não podem prevalecer sobre o que está previsto na Constituição.

“Há sempre que se observar e relembrar que a nova ordem constitucional prevista no artigo 226, da Carta Maior, alterou os requisitos necessários à concessão do Divórcio Direto Consensual. De tal sorte que, não havendo mais a necessidade de se perquirir acerca de causas da separação a da causa ao divórcio, descabe a audiência de ratificação do divórcio, quando o magistrado entender apta a sua concessão de imediato. Trata-se, em verdade, de nova interpretação sistemática, em que não pode prevalecer normas infraconstitucionais do Código Civil ou de outro diploma, que regulamentavam o que previsto de modo expresso na Constituição e que esta excluiu posteriormente, como no presente caso”.

O ministro citou ensinamento do jurista Paulo Lôbo, diretor nacional do IBDFAM, o qual alerta que a Constituição deixou de tutelar a separação judicial. “A consequência da extinção da separação judicial é que concomitantemente desapareceu a dissolução da sociedade conjugal, que era a única possível, sem dissolução do vínculo conjugal, até 1977. Com o advento do divórcio, a partir dessa data e até 2009, a dissolução da sociedade conjugal passou a conviver com a dissolução do vínculo conjugal, porque ambas recebiam tutela constitucional explícita. Portanto, não sobrevive qualquer norma infraconstitucional que trate da dissolução da sociedade conjugal isoladamente, por absoluta incompatibilidade com a Constituição, de acordo com a redação atribuída pela PEC do Divórcio”.

A alegação do MP-RS de que o novo texto constitucional, através da EC nº 66, de 2010, não revogou as disposições infraconstitucionais a respeito do divórcio consensual, tendo apenas retirado a antiga exigência de comprovação do preenchimento do requisito temporal para obtê-lo, segundo o ministro, afastou-se da melhor interpretação da CF/88 ao caso concreto.

“Não se desconhece que a Lei do Divórcio ainda permanece em vigor, discorrendo acerca de procedimentos da separação judicial e do divórcio (artigos 34 a 37, 40, § 2º, 47 e 48), a qual remete ao CPC (artigos 1.120 a 1.124). Entretanto, a interpretação de todos esses dispositivos infraconstitucionais deverá observar a nova ordem constitucional e a ela se adequar, seja por meio de declaração de inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, seja como da interpretação conforme aConstituição ou, como no caso emcomento, pela interpretação sistemática dos artigos trazidos nas razões do recurso especial”.

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